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CAPITAL DA NOTÍCIA DÁ IMPORTANTES PASSOS NO INÍCIO DA LEITURA DE CENÁRIOS E DADOS, MAS PRECISA AVANÇ

Escrever sobre assuntos que refletem os altos e baixos da economia e do mercado é um desafio incessante de interpretação. É necessário ao jornalista compreender o assunto tal como um enredo de teatro, percebendo como os elementos da trama se desenrolam e se interligam para construir aquela cena que se apresenta. Na edição, voltada ao mercado de trabalho, já se percebe alguns importantes passos nesse sentido e no exercício de começar a desenvolver a leitura de cenários.

Ligar o índice de produção industrial ao desemprego, por exemplo, é o primeiro passo. Mas ainda pode-se avançar no sentido de abrir o campo de visão para compreender o cenário na maior amplitude possível. A questão do desemprego pode-se ser analisada, por exemplo, antes de tudo por uma diminuição do poder aquisitivo, que afeta o comércio e encadeia uma série de fatores até chegar à indústria, que, por sua vez, reflete em toda uma cadeia de fornecedores, criando um círculo nada virtuosos sob o ponto de vista econômico.

Os esforços em trazerem dados para sustentarem as matérias é um ponto fortíssimo da edição. E o Google está aí para ajudar a fugir do básico e chegar a um recorte cada vez mais próximo do assunto discutido. Nesse sentido, é necessário cuidado redobrado para não se estabelecer algumas relações um pouco forçosas entre os dados e os fatos. Um exemplo é ligar o índice de desemprego diretamente à substituição da força de trabalho por novas tecnologias. Além das fontes enfraquecerem a manchete defendida, sugerindo que há outras questões envolvidas, certamente há números que abordam diretamente e dariam mais credibilidade ao assunto.

A sustentação das matérias apenas na fala de fontes também é um elemento que merece atenção. É essencial fazer perguntas pertinentes e não apenas reproduzir o pensamento do entrevistado. As vagas para corretores de imóveis estão aumentando? Até podem estar, mas essa visão contraria toda uma percepção de mercado e talvez aí tenha se perdido a chance de escrever uma grande matéria. O que se sabe é que o setor de construção civil está em crise, o acesso a crédito para financiamentos à imóveis com vários obstáculos, imóveis demorando para serem vendidos, entre outros elementos. Faltou apuração, sondagem do mercado sobre as vagas e a visão crítica de que, talvez, muitos profissionais passaram a liberais porque perderam seu emprego com carteira assinada e não pelos atrativos atuais do setor.

Há algumas notícias que pecam pelo critério pela qual foram pautadas. Ao noticiar o aumento da procura pelos cursos técnicos, faltou analisar o efeito prático na vida do leitor. O que esses futuros técnicos, ou também tecnólogos, vão encontrar no mercado? As empresas querem esses profissionais? Quais as perspectivas de carreira? Além disso, o jornal é universitário e feito por universitários. Perde-se a chance de comunicar-se melhor com esse público. O aumento de vagas de estágio pode ser reflexo da necessidade de mão de obra mais barata em um mercado em crise. Como identificar quando a função é benéfica para formação, como defendido na matéria, e não o contrário. Essa proximidade com algumas temáticas podia ter sido aproveitada de forma mais positiva.

Mesmo em um espaço limitado de meia página, algumas dessas reflexões ajudam na abordagem das matérias de forma mais assertiva, orientando o trabalho desde a apuração e entrevistas até a seleção do que será apresentado pelos textos. É imprescindível lembrar que em matérias voltadas ao mercado, mais do que relatar os fatos que já se concretizaram, é importante trazer a interpretação dos mesmos.

Leia também o ombudsman do repórter Shelbert Braz: //bit.ly/2gn4xsR


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