PRECONCEITO AFASTA TRAVESTIS E TRANSEXUAIS DO MERCADO DE TRABALHO NO BRASIL
Foto: Tom Shiebel
Pesquisas apontam que o mercado de trabalho é hostil para travestis e transexuais, mas histórias de sucesso mostram que é possível enfrentar as dificuldades e prosperar
De acordo com dados da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), apenas 10% dos travestis e transexuais brasileiros estão no mercado de trabalho formal; os outros 90% acabam se prostituindo por falta de oportunidades de emprego. Apesar de não existirem pesquisas oficiais referentes especificamente à situação na capital paranaense, o Transgrupo Marcela Prado acredita que Curitiba acompanha o panorama nacional. Além disso, de acordo com a ONG TransgenderEurope, o Brasil ocupa a primeira colocação no ranking de homicídios contra travestis e transexuais, com mais de 600 assassinatos registrados no país entre 2008 e 2014.
Esses dados, por si só, mostram como essas pessoas não têm dificuldade apenas para arrumar um emprego formal. "A estrutura da sociedade brasileira é sabidamente preconceituosa. Aquilo que se afasta de um certo padrão normativo é visto com desconfiança ou, muitas vezes, medo. É possível afirmar que o preconceito contra travestis e transexuais tem dimensões muito maiores do que a 'simples' hostilidade ou ridicularização, acaba empurrando essas pessoas não somente para a informalidade, como também para o risco", analisa o professor de Sociologia Benito Eduardo Maeso.
Histórias de superação
A advogada Gisele Alessandra Schmidt e Silva e a professora Laysa Machado não se deixaram intimidar pelo preconceito e pelas estatísticas ruins e foram atrás de seus sonhos. Porém, mesmo tendo atingido o sucesso profissional, ambas reconhecem a dificuldade que é para um transexual conseguir emprego.
Para Gisele, a primeira advogada transexual do Paraná, o preconceito não é a única barreira encontrada por transexuais e travestis. "A falta de informação também é um problema. Os transexuais sofrem tanto preconceito desde novos que acabam desistindo dos estudos, não tendo formação. E isso dificulta muito", comenta.
Ela conta que o momento mais difícil de sua vida foi durante o período escolar, em que chegou a sofrer bullying por parte de um professor. "Ele ficou me dando apelidos". Mas, com o passar do tempo, Gisele encontrou uma fórmula para deixar isso para trás e buscar seus objetivos: "Eu tracei um caminho e fui estabelecendo metas: entrar na faculdade, passar na monografia e, enfim, passar no exame da ordem dos advogados e conquistar o meu espaço no mercado". Hoje, Gisele é especialista em direito criminal, trabalha em um escritório de advocacia e atende clientes particulares.
Outro caso de sucesso é o de Laysa Machado, a primeira transmulher professora e diretora de escola do Brasil.
Assim como Gisele, Laysa também teve que lidar com o preconceito durante a vida, e se considera mais do que vitoriosa. "Nessa sociedade transfóbica, preconceituosa e discriminatória em que vivemos, nós somos sobreviventes".
A estratégia de Laysa foi esperar estar estabelecida no mercado de trabalho para assumir a sua transexualidade. "Só após estar estabelecida financeiramente fui viabilizar minha transição. Além disso, também estudei muito para passar em concurso público, assim eu sabia que mesmo me assumindo como transexual não poderia ser demitida".
Ela também diz acreditar que a falta de estudo é o que leva à prostituição. "Muitas transexuais param de estudar, são expulsas da família, expulsas da escola e acabam não encontrando chances em trabalhos formais, e entram na prostituição por isso".
Histórias como as de Gisele e Laysa mostram que mesmo em um país onde o preconceito e a descriminação são muito fortes, com dedicação e estudo todos podem atingir seus objetivos, independente de classe, raça ou gênero.